Entenda os porquês do sucateamento da AMS da Petrobrás

Atendimento ineficiente e muitas vezes discriminatório, informações conflitantes, longas esperas para cirurgias de alto risco, carência de médicos especializados, terceirização? À primeira vista, o cenário caótico descrito acima parece envolver os velhos transtornos gerados pela falta de investimento dos governantes no sistema público de saúde brasileiro. Parece, mas não é.

Os problemas citados acima fazem parte de uma rotina cada vez mais comum, e alarmante, de aproximadamente 300 mil pessoas que dependem da AMS ? Programa de Assistência Multidisciplinar de Saúde criado há mais de 30 anos pela Petrobrás após muita pressão dos trabalhadores, mas que hoje sofre um profundo sucateamento.

A precariedade do serviço, que passa por falhas nos credenciamentos, lentidão nos ressarcimentos e número reduzido de clínicas e profissionais credenciados, é tão agravante que acabou por criar uma anomolia: diante dos problemas que se acumulam, no lugar de buscar soluções e aumentar os investimentos, a companhia passou a firmar parcerias com planos de saúde privados como a Amil ? empresa que em pesquisa recente do Instituto Datafolha foi apontada pela classe médica do País como a 2º que mais interfere na autonomia técnica dos médicos. Interferências que vão desde redução da solicitação de exames e de internações até à recusa total ou parcial de verba de procedimentos, além de outros ataques ao livre exercício da medicina.

A tendência da Petrobrás em firmar parcerias com planos de saúde privados que por sua própria natureza seguem a lógica de mercado mostra que o sucateamento da assistência médica oferecida aos petroleiros não é mera coincidência. Por trás disso, existe um interesse: acabar com a AMS.

Um problema político
A razão de tantos absurdos não é de caráter técnico. É político. Numa ação estratégica, a Petrobrás transferiu a gestão do plano ao Recursos Humanos. Desde então, a qualidade do serviço e atendimento da AMS sofreu uma queda vertiginosa.

Setor responsável (em tese) por humanizar e harmonizar as relações de trabalho entre patrão e empregado, objetivo falacioso e estruturalmente impossível devido aos conflitos de interesses e forças desiguais, o RH conduz na prática um modelo de gestão totalmente voltado para o aspecto econômico em detrimento do humano. No caso, mais recursos (para a empresa) e menos humanos (para os empregados).

Toda a burocracia e lentidão para conseguir consultas ou o credenciamento de novas especialidades são empecilhos criados justamente pelo RH, cujas decisões são tomadas com base em questões políticas e econômicas ? não técnicas. No Litoral Paulista, por exemplo, o serviço de vasectomia que já havia sido aprovado não foi implantado por interferência do RH. O entrave? Os valores de mercado.

Outro exemplo grave é o Call Center 24 horas, serviço que passou por um completo processo de terceirização. Se para a empresa esta medida foi positiva, uma vez que reduziu custos com encargos sociais e folhas de pagamento, para os usuários não é possível dizer o mesmo. Hoje, o serviço possui um atendimento desatualizado e ineficiente, aprofundando ainda mais o distanciamento dos usuários com a AMS.

O poder do RH não é pequeno. Ironicamente, o setor que deveria promover uma gestão descentralizada, proporcionando maior participação e possibilidade de criação para os funcionários é o responsável por centralizar em torno de si tudo relacionado a AMS. Hoje, as decisões que antes eram tomadas pelos empregados da área de saúde (médicos, enfermeiros, especialistas), estão sendo executadas por pessoas indicadas por interesses políticos e que, por razões óbvias, rezam a cartilha da empresa.

Não é mera coincidência o fato de que o RH é um dos setores mais estratégicos e com maior volume de ex-sindicalistas em cabides de emprego. Cabe a esses senhores dar suporte e ponte às políticas perversas e discriminatórias da direção da empresa. Este tipo de gestão já é muito conhecida pelas práticas do PSDB em empresas públicas. O que surpreende é PT e Petrobrás se apropriarem deste recurso nefasto para atacar os trabalhadores, com o desmonte de benefícios e direitos conquistados após anos de lutas.

?Nossas mãos estão atadas?
A frase acima, dita por um empregado do corpo gerencial do Compartilhado em forma de desabafo, ilustra um sentimento de inúmeros trabalhadores que atuam em áreas técnicas da AMS: a completa ausência de autonomia para desenvolver seus trabalhos e tomar decisões.

O pouco de independência que esses profissionais ainda tinham simplesmente evaporou. Hoje, muito do que é desenvolvido por esses profissionais esbarra na política de redução de custos da empresa, conduzida com mãos de ferro pelo RH. Não há qualquer espaço para participação real dos profissionais que deveriam estar à frente dessas decisões.

Acabar com o poder do RH e com a terceirização
A FNP defende o fim da terceirização dos serviços prestados pela AMS, que apenas aprofunda o esfacelamento do programa, e que decisões envolvendo pontos importantes como liberação de procedimentos, exames e cirurgias, sejam tomadas com base em análises técnicas. Neste sentido, é preciso acabar com o poder que o RH exerce sobre os setores que de fato deveriam gerir o plano, mas que hoje possuem autonomia limitada e, em muitos casos, até mesmo nula.

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