Fissuras na democracia brasileira

A Federação Nacional dos Petroleiros (FNP) está realizando uma série de entrevistas com representantes de importantes institutos, que fizeram parte da construção da luta da categoria petroleira nos últimos anos.

Diante da visão autoritária e repressiva do governo eleito, que se propõe a destruir direitos, enquadrar os movimentos sociais como terroristas e a tratar com violência a oposição, Renata Belzunces fala sobre as ofensivas de Bolsonaro e as fissuras na democracia.

Renata é cientista social, economista, doutorando pelo Prolam/USP e técnica do Dieese. Agora, confira os principais trechos da entrevista.

FNP – A vitória de Bolsonaro coloca o futuro do país em questão?
Renata Belzunces (RB) – Sem dúvida. A cada eleição temos a sensação que o futuro do país está em jogo, parte pode ser explicado pela fragilidade e falta de credibilidade de nossas instituições. Na economia temos observado uma série de propostas e reformas contrárias ao texto e ao espírito da Constituição Federal de 1988. Queremos acreditar na democracia e no funcionamento pleno dos poderes em separado, mas sempre surgem elementos que colocam em xeque essa crença. A democracia vale a pena, sem dúvida, a dúvida é se a nossa será gerida por um democrata de espírito público.

FNP – Devemos enfrentar uma batalha sobre quais perdas, nos próximos anos?
RB – 
As batalhas se darão em torno da reordenação distributiva entre capital, trabalho e em meio a isso  a redefinição do papel do Estado. O programa nebuloso do presidente eleito passa pelo  fortalecimento do pólo dos empresário, enfraquecimento do poder reivindicatório dos trabalhadores e diminuição do Estado. Como exemplo temos  a reafirmação da reforma trabalhista ao mesmo tempo em que se busca estrangular manifestações divergente através do sufocamento dos sindicatos e eliminação de ´qualquer ativisimo´. Também será reafirmado a PEC do Fim do Mundo ou Emenda Constitucional 95 que limita o teto dos gastos públicos por 20 anos, quais recursos deverão ser aqui comprometidos? Os recursos dos mais altos estratos sociais parecem garantidos, bastar cita o recente aumento do salário dos juízes de R$ 33 mil para R$ 39 mil. Quem pagará essa conta? A creche, o SUS, o saneamento, a universidade e o meio ambiente, parece que não deverão gozar dos mesmos privilégios.

 FNP – Como você vê o projeto para educação proposto pelo candidato eleito a presidente do Brasil?
RB – 
Desastroso, atrasado e antinacional.  Todos as medidas anunciadas estão nesse sentido:  diminuição de qualidade, conteúdo, ameaças abertas aos cursos e áreas de ciências humanas,  riscos democráticos, risco à autonomia universidade,  fim do projeto de universalização de creches, fim da gratuidade das universidades e  desvalorização da conhecimento gerado no país (vamos comprar dos demais países).  Digo isso com base às declarações e ao diminuto programa de governo apresentado ao TSE, pois de fato é desconhecido ainda algo que se possa chamar de projeto para educação.

FNP – Como fica a Petrobrás neste contexto político e o que está em jogo com a sua privatização?
RB – 
A Petrobrás mais uma vez se funde a história do nosso país. No início foi símbolo  da industrialização e da desejada autossuficiência estratégica em relação aos combustíveis. Recentemente acabou sendo o estopim de uma crise cujos desdobramentos desembocaram em um golpe de Estado que significa uma regressão neocolonial no Brasil. Compartilho das análises que apontam para a convergências entre interesses de grandes potências sobre o nosso petróleo, que em aliança com o que há de mais atrasado na política, arquitetaram o golpe e aprofundaram sua influência com a eleição de Bolsonaro.  A Petrobras precisa ser defendida.  Para que isso realmente ocorra seus trabalhadores e demais envolvidos na discussão precisam reconquistar a população com um amplo projeto de geração de energia voltado para um projeto nacional. Temos também que superar o legado do  desenvolvimentismo a todo custo, pois isso implicou  em danos ao meio ambiente e à população do entorno. Para que a  Petrobras seja efetivamente defendida é necessário reconstruir laços com a sociedade.

 FNP – As privatizações resolvem o problema da dívida pública do país?
RB – De forma alguma, se resolvesse teríamos saído dos anos 90 sem dívida alguma. As privatizações servem ao objetivo  de reordenar o sistema social entre capital, trabalho e o papel do Estado. Empresas como a Embraer, agora no radar da gigante norte americana Boeing, foram vendidas por valores vis.  A privatização nunca foi mecanismo eficiente para isso. Para começar a resolver a dívida pública é essencial uma reforma tributária que aponte para o aumento da arrecadação sobre os mais ricos, outra ação necessária é auditar a dívida pública atual a fim de compreender o que de fato é devido e se temos utilizado os mecanismos corretos para sua administração.

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