* Fabíola Calefi e Raíra Coppola
A presidente da Petrobrás, Maria das Graças Silva Foster, participou no dia 29 de novembro de 2012, do Encontro Nacional Mulher, Ciência e Tecnologia. Nesse encontro, a presidente fez um discurso eloquente e destacou que a participação no evento faz parte de um plano de ação da companhia para a obtenção, pela quarta vez, do Selo Pró-Equidade de Gênero do Governo Federal.
Nós, do movimento sindical petroleiro independente, avesso às amarras do sindicalismo chapa branca, temos o dever de esclarecer a categoria sobre a enorme contradição de tal “objetivo”.
A realidade x o discurso
As mulheres trabalhadoras da Petrobrás vivem uma realidade completamente diferente daquela construída nos discursos e propagandas da Petrobrás sobre a questão de gênero. E não são apenas os dirigentes sindicais que dizem isso. As petroleiras, que diariamente sofrem com a negligência da companhia nesse campo, sabem disso.
Para se ter uma ideia, as petroleiras que trabalham na área operacional não têm sequer a garantia de banheiros e vestiários femininos. Já aquelas que trabalham embarcadas não possuem camarotes exclusivos, tendo que dividi-los muitas vezes com os homens. As trabalhadoras indiretas, grande número entre os empregados terceirizados, nem têm o direito à licença maternidade garantido, e quando consegue é sob o custo de um forte e sistemático assédio moral.
Os casos de assédio sexual, apesar de serem um grande tabu nos corredores da alta cúpula da empresa, também fazem parte desta triste realidade. E, evidentemente, a maior parte desses casos é motivada por gerentes que usam e abusam do poder, convictos de sua condição de intocáveis. As punições formais e brandas a esses gerentes, que insistem em “cair pra cima”, são reflexo desse enorme e perigoso sentimento de impunidade que estimula e multiplica os casos de assédio sexual na empresa. Enfim, as mulheres não têm voz na hora de reivindicar direitos mínimos.
Em contrapartida, a Carta da Presidente, enviada a toda força de trabalho em 10 de dezembro, traz um trecho muito interessante: ?Por isso, convido cada um de vocês a assumir comigo o compromisso de atuar firmemente para identificar e eliminar todas as formas de discriminação, inclusive as mais sutis, muitas vezes as mais nocivas ao ambiente corporativo?. Então, vamos lá:
Podemos citar como exemplos recentes de formas de discriminação que devem ser eliminadas a demissão da companheira Ana Paula, do Terminal Cabiúnas, base do Norte Fluminense, que mesmo exercendo seu mandato na CIPA e candidata ao CA da Transpetro foi demitida por denunciar as condições inseguras de trabalho.
Em outro caso, este na UTGCA, aqui no Litoral Paulista, a gerência afirmou que preferia trocar uma empregada que trabalhava na área por um trabalhador homem a ter que adequar um banheiro feminino. E na mesma semana do dia 29, um médico do trabalho da REFAP ao palestrar sobre a questão do benzeno para os integrantes da CIPA afirmou que a empresa deveria ?proibir? mulheres de trabalharem nas áreas com exposição ao benzeno porque acarretam grande prejuízo à empresa ao serem afastadas no período de gestação e na licença maternidade.
Ou seja, concordamos com a presidente quando diz que devemos combater os casos mais sutis, mas devemos alertá-la que, infelizmente, não temos apenas casos sutis de discriminação, mas sim acontecimentos escancarados e públicos que até agora não foram solucionados.
Há quem diga que esses são casos isolados, mas poderíamos citar uma lista enorme de casos de assédio moral, sexual, humilhação, retirada de direitos e exploração dentro do Sistema Petrobrás contra as mulheres e o conjunto dos trabalhadores. Por isso, é uma violência contra essas trabalhadoras, que tanto sofrem cotidianamente, a empresa ganhar um selo de ?equidade de gênero? ou dizer que apóia a luta pelos direitos humanos.
Infelizmente, ter uma mulher na Presidência da República ou na presidência da Petrobrás não assegura por si só os direitos das mulheres trabalhadoras. Pelo contrário, quando não se reverte em políticas concretas em defesa das mulheres dissemina uma ideologia de empoderamento da mulher, cuja lógica perversa é nos convencer de que com esforço e muita garra todas as mulheres são capazes de alcançar altos cargos, deixando de lado nossas reivindicações e tarefas históricas.
A realidade para a maioria das mulheres trabalhadoras não permite que criemos ilusões sobre tal empoderamento. No mercado de trabalho, somos quase 50% da força de trabalho, mas ganhamos de 30 a 70% menos que os homens, nas mesmas funções. Somos 40% dos chefes de família, tendo que exercer a dupla jornada de trabalho, com duas horas a mais de trabalho que os homens, afinal somos forçadas a continuar “cuidando do lar”. Sem contar com a violência que a mulher enfrenta: a cada 5 horas duas mulheres morrem por motivos de gênero. Apenas na Baixada Santista os índices de estupro subiram 92% em relação ao ano passado.
Como as mulheres que vivem essa realidade podem alcançar uma boa colocação no mercado de trabalho? Quem dirá, tornarem-se engenheiras e ainda disputar cargos em empresas como a Petrobrás.
Por isso, as mulheres petroleiras precisam unir-se às reivindicações da categoria petroleira e junto com os companheiros homens exigir melhores condições de trabalho, reconhecimento do agente benzeno para direitos como afastamento da atividade (não do trabalho) durante a gestação e Licença maternidade garantida (inclusive para as terceirizadas), aposentadoria especial e salário igual para trabalho igual, assim como bandeiras mais gerais, que colocadas em prática também elevariam nosso padrão de vida como a luta por uma Petrobrás 100% estatal, a revisão do PCAC, o fim da tabela congelada, a escolha pelo Petros BD, dentre outras medidas para assegurar uma vida laboral digna e uma aposentadoria decente.
* Fabíola Calefi é petroleira do Compartilhado Santos e Raíra Coppola é petroleira da RPBC. Ambas fazem parte da direção do Sindipetro-LP e atuam no Departamento de Mulheres da entidade.