Desde 1999 a Petrobrás não tinha um prejuízo em suas contas. E no segundo trimestre de 2012 registrou um prejuízo de R$ 1,3 bilhão. A causa? A importação mensal de mais de 2 milhões de litros de gasolina para abastecer a frota de automóveis que cresce à razão de 3,5 milhões de carros por ano.
Até 2009, o Brasil era praticamente autossuficiente em gasolina. Mas os estímulos do governo à indústria automobilística, combinados com as quase inexistentes políticas transporte público levaram ao brasileiro a optar por comprar automóveis a usar os sistemas de transportes públicos das cidades brasileiras.
Se em 2000 o Brasil tinha pouco mais de 29 milhões de veículos (carros, motos, ônibus e caminhões), em 2012 o tamanho da fota nacional de veículos já ultrapassava os 72 milhões. A consequência mais óbvia pode ser vista nas cidades brasileiras: 260 km de congestionamentos em São Paulo e 160 km de congestionamentos no Rio de Janeiro, só para citar as duas maiores cidades brasileiras.
E muita, muita poluição e acidentes. Só em 2010, mais de 41 mil mortos em acidentes.
E essa frota de automóveis é sedenta de combustíveis: gasolina, álcool e diesel. No caso específico da gasolina, em 2012 foram necessários importar mais de 3,5 bilhão de litros para satisfazer esses milhões de carros e motocicletas. Em 2011 o Brasil gastou US$ 1,6 bilhão em importações de gasolina e em 2012 o Brasil gastou US$ 2,91 bilhões. Usando uma taxa de câmbio média de R$ 2,00 para cada US$ 1,00 , a Petrobrás teve de importar mais de R$ 9 bilhões em gasolina.
São R$ 9 bilhões de prejuízo na balança externa brasileira. E o problema não acaba aí. É e será muito mais grave.
A Petrobrás não pode ficar engolindo esse prejuízo sem repassar ao preço da gasolina. E como o Transporte Público brasileiro está concentrado nos automóveis, motocicletas e ônibus e não nos Metrôs, VLTs e Ônibus Elétricos, o repasse do prejuízo da importação da gasolina desencadeará uma inflação a todos os produtos relacionados com o transporte: mão-de-obra, alimentos, eletrodomésticos etc.
Um aumento de 15% no preço da gasolina pode causar uma inflação inicial de 2% a 4% em menos de dois meses. E isso afeta às contas públicas, na medida em que a dívida pública de R$ 1, 9 trilhão (um trilhão e novecentos bilhões de reais) em setembro de 2012, tem grande parte dela indexada à correção da inflação.
Ou seja, a dívida pública aumentará por conta da inflação, podendo chegar e ultrapassar os R$ 2 trilhões em poucos meses
Gasolina A se refere à gasolina pura, que será misturada com álcool (etanol), para fazer a mistura que é o padrão do combustível brasileiro
E se a frota de Automóveis continuar a crescer?
E com o crescimento da frota de automóveis, já que o governo federal isenta o IPI e governos estaduais isentam os carros novos de IPVA (como o Distrito Federal), a necessidade de importar gasolina não diminui.
Segundo o Secretário de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis do Ministério das Minas e Energia, Marco Antônio Almeida, em 29 de agosto de 2012, o Brasil, através da Petrobrás terá de gastar até R$ 58 bilhões em importações de gasolina até 2020 se o crescimento da frota nacional de veículos continuar na proporção atual.
É importante frisar que esse problema não foi criado pela Petrobrás. Muito pelo contrário, ele caiu no colo da empresa por mau planejamento governamental, que preferiu gastar em corredores de ônibus e incentivos à indústria automobilística.
Como a Petrobrás, que está investindo mais de R$ 100 bilhões na exploração do Pré-Sal, na aquisição de navios petroleiros, de navios-plataforma, na construção de duas mega-refinarias pode desviar ou interromper esses investimentos sem quebrar?
A armadilha do transporte individual motorizado vai levar o Brasil inexoravelmente a uma crise, com a retomada da inflação. E não se pode deixar de mencionar que vai-se chegar a um momento em que as vendas de automóveis vão se estagnar, pois ninguém consegue dirigir dois veículos ao mesmo tempo.
É o que houve nos Estados Unidos, onde cidades dependentes da indústria automobilística, como Chicago, faliram pelo esgotamento da compra de automóveis.
Financeiramente, não há como a Petrobrás absorver a conta da importação da gasolina sem repassar ao preço da gasolina vendida ao consumidor. E não adianta apontar a substituição da gasolina pelo álcool, pois teria-se de dobrar a área plantada em menos de três anos. E novamente após outros seis anos. E isso seria feito através da substituição das lavoura de milho e soja, o que gerará outra cadeia inflacionária pela diminuição brutal da oferta de alimentos.
Segundo empresários do setor canavieiro, seriam necessários R$ R$ 130 bilhões de investimentos para que a indústria da cana pudesse atender essa demanda de combustível. Isso é pouco menos que a necessidade das 10 maiores cidades brasileiras implantarem 20 novas linhas de metrôs a um custo médio de R$ 5 bilhões por cada nova linha.
Metrôs , VLTs, Ônibus Elétricos, Bicicletas e Pedestres são a solução inteligente para a Mobilidade Urbana
E é exatamente aí que está a grande chave que pode resolver essa crise que virá: se o Brasil trocar o modelo de transporte individual motorizado (carros e motocicletas) e de corredores de ônibus por Metrôs, Veículos Leves sobre Trilhos (VLTs) e Ônibus Elétricos, a necessidade por mais gasolina (e álcool e diesel) irá parar e em seguida diminuirá.
Se a cada ano pudermos diminuir 2% dos veículos individuais por Transporte Público de Qualidade, no primeiro ano a importação de gasolina irá estabilizar. No segundo ano em diante, irá diminuir a importação na mesma proporção e pressão nas contas diminuirá igualmente.
E a questão da Energia Elétrica? Como suprir Metrôs, VLTs e Ônibus Elétricos, se o Brasil está passando por seguidos apagões?
O Brasil tem uma manutenção precária no setor de transmissão de energia. A perda de corrente dentro do sistema de distribuição é um prejuízo que é sempre omitido pelos governantes, que preferem gastar em obras do que em manutenção.
Pegando novamente o caso de Brasília como modelo, a companhia estadual de eletricidade (CEB) tem seguidamente derrubado o fornecimento de energia no DF. E ao mesmo tempo, construiu uma hidroelétrica em Corumbá (GO) para suprir as necessidades do DF até 2060. A causa é simples: a manutenção está sucateada.
No caso do Brasil, há ainda o potencial inexplorado da energia eólica, já estimado em mais de 1 GigaWatt (1.000 megawatts). Isso sem mencionar parques eólicos como o de Caetité (BA), que mesmo estando prontos, não podem enviar sua energia pois a Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF) não construiu os 120 km das linhas de transmissão.
Além disso, ao se retirar de circulação ônibus, carros e motocicletas, as temperaturas dos grandes centros urbanos irá cair. Em São Paulo, os dias de pouca circulação de automóveis são acompanhados de melhoria nas condições atmosféricas. Nesses dias, o consumo de energia cai igualmente.
Isso diminui a pressão do uso de ar condicionados, que é um dos maiores sugadores urbanos de energia elétrica. E essa energia poderá ser usada pelos Metrôs, VLTs e Ônibus Elétricos.
Com a diminuição dos veículos em circulação, a Mobilidade aumentará, assim como diminuirão os acidentes e as doenças relacionadas à poluição. Novamente diminuirá o custo social que o trio Carros-Ônibus a Diesel-Motos causa ao Brasil.
Há vários anos estamos tentando convencer às autoridades de planejamento que a cilada do Transporte Individual e dos Corredores de ônibus levará o Brasil a uma forte crise. Fomos à audiências públicas no Senado Federal, nos Ministérios Públicos, nos executivos Federal e do Distrito Federal e o lobby automotivo sempre ganhava.
Agora, se os governos não reverterem as políticas de Transporte Individual e de Corredores de Ônibus, a economia brasileira poderá quebrar. Esperamos que agora estejam mais propensos a nos escutarem.
* Artigo de Carlos Tautz, jornalista e coordenador do Instituto Mais Democracia ? Transparência e controle cidadão de governos e empresas.