As lições de uma greve histórica dos petroleiros

A categoria realizou uma greve histórica. A mobilização que percorreu unidades da Petrobrás de todo o Brasil por oito dias consecutivos, a partir de 17 de outubro, empolgou petroleiros, estudantes, ativistas e trabalhadores de outros setores de norte a sul do país. O sentimento de solidariedade e de unidade foi, mais uma vez, reeditada.

Tivemos refinarias paralisadas em todo o país, corte de produção em algumas plataformas e uma série de unidades com portões completamente fechados – deixados sob a responsabilidade dos grupos de contingência, formados pelos pelegos. Em muitas bases, petroleiros diretos e terceirizados se uniram contra o leilão de Libra e pela derrubada do PL 4330. A unidade da categoria foi excepcional; inclusive, para enfrentar as balas de borracha e gás de pimenta do Exército do governo Dilma no ato contra o leilão e os interditos proibitórios, o assédio moral, a perseguição, a insegurança e as práticas antissindicais da empresa.

Desde a greve de 1995 essa foi a maior mobilização de petroleiros dos últimos vinte anos. A repercussão foi enorme. Por isso, é com o sentimento de que realizamos uma greve vitoriosa que nos preparamos para os próximos enfrentamentos com muito mais forças.

Por que a greve foi vitoriosa?
Em primeiro lugar, porque ao se converter em uma mobilização de cunho fortemente político contra o leilão de Libra, em defesa da soberania nacional, a greve colocou o debate da privatização do pré-sal em rede nacional, fazendo com que um tema até então invisível ganhasse as manchetes dos jornais de todo o Brasil. Não conseguimos barrar o crime de lesa-pátria cometido por Dilma, é verdade, mas por outro lado a população (antes alheia ao tema) foi de repente bombardeada com informações sobre a entrega do nosso petróleo. Dilma, por causa do desgaste causado pela greve e pelo escândalo que representou a venda do pré-sal, foi obrigada a se pronunciar na tevê.

Em segundo lugar, porque a categoria redescobriu o poder que tem nas mãos. Houve um avanço significativo na consciência dos trabalhadores. Ou seja, o que falávamos no início da campanha, de que era possível lutar e vencer e que as jornadas de junho poderiam e deveriam servir de inspiração, se comprovou na realidade. Foi muito bonito ver uma mobilização que atingiu a imagem e a produção (mesmo que parcialmente) da empresa nacionalmente, com unidades em todo o país aderindo ao movimento.

E como prevíamos e defendíamos desde o início, as campanhas pela derrubada do Leilão de Libra e por um ACT vitorioso se converteram em uma luta só, com uma combinação que certamente ajudou a categoria a fortalecer o movimento, mesmo que inconscientemente.

Está claro, também, que as cláusulas conquistadas no ACT foram fruto ? única e exclusivamente ? da greve. A empresa saiu do pedestal, assumiu uma postura defensiva e realizou alguns avanços ? mesmo que muito tímidos em nossa opinião. Mas a principal vitória da campanha reivindicatória foi, sem dúvidas, a greve ter forçado a companhia a recuar em uma série de ataques.

O regramento da PLR, que joga sobre as costas dos trabalhadores a responsabilidade por vazamentos, além dos regimes de trabalho que contrariam a necessidade de aumento do efetivo e primeirização, foram retirados pela companhia. A AMS para os aposentados da Transpetro, bandeira histórica da FNP, também foi conquistada, assim como o fundo garantidor aos trabalhadores terceirizados, que sofrem há anos com os calotes das contratadas. E, mesmo sob a lógica perversa das remunerações variáveis, a companhia se viu obrigada a aumentar os reajustes propostos inicialmente para o abono e RMNR.

Embora não possam mais fazer greve, os aposentados e pensionistas também foram à luta nesta campanha. E também saudamos estes companheiros por isso. Durante a campanha reivindicatória estiveram em diversos piquetes e atos da categoria, voltando ao chão de fábrica para se solidarizar com os trabalhadores ativos. Além disso, fizeram uma bonita ocupação no Edise, no Rio de Janeiro, organizada com o apoio da FNP, que influenciou diretamente na formação de uma comissão pela presidente Graça Foster e na decisão da companhia de realizar acordos judiciais sobre os níveis de 2004, 2005 e 2006.

Era possível muito mais!
Se por um lado a categoria sai fortalecida, por outro também é verdade que era possível conquistar muito mais. E muitos trabalhadores aprovaram a assinatura da proposta patronal com este sentimento, com a sensação de que podíamos avançar ainda mais.

Infelizmente, no momento de maior radicalização e força da greve, a FUP resolveu desmontar a mobilização e a unidade da categoria com um indicativo de aceitação sustentado por uma mentira: a de que a Petrobrás havia garantido de que não realizaria punições. Pelo texto da proposta da empresa está claro que não é verdade. O que a companhia ?garante? é ?discutir com os sindicatos? antes de tomar qualquer medida sobre possíveis excessos cometidos. Oras, que garantia é essa? Nenhuma! Por isso, dizemos que mais uma vez fomos traídos pela FUP que, conscientemente, precipitou o fim da greve em seu auge.

Foi o desmonte mais rápido da história! Na noite do dia 22, às 23 horas, o informe da FUP era de continuidade da greve. Mas, poucas horas depois, a FUP deu marcha à ré. Os petroleiros acordaram no dia 23 e a FUP havia iniciado assembleias para desmobilizar a greve. Assembleias tumultuadas, a exemplo do Norte Fluminense, que não fez assembleia em nenhuma plataforma, só em Campos e Macaé, sendo que em Macaé a votação ficou empatada. Fora as assembleias-relâmpago em bases menores.

Essa postura foi combatida pela FNP, que tentou dar continuidade à greve buscando arrancar um acordo mais vantajoso para a categoria. Dizíamos, “a categoria pode mais!”, mas a unidade da luta, que foi a âncora da força da greve, estava rompida. Com isso, a FNP considerou que não era possível seguir sozinha na greve, indicando a suspensão da greve.

Para nós, o desfecho prematuro da greve demonstra quem são os verdadeiros divisionistas da categoria. Em hipótese nenhuma, sob pena de prejudicar a categoria, iríamos romper a unidade construída na luta.

Não por acaso, sempre reivindicamos mesa única de negociação e calendários unificados de greve. Não por acaso, ao contrário dos governistas, sempre inserimos em nossos informes o quadro nacional de mobilizações nos 17 sindipetros, pois entendíamos a importância de valorizar a greve realizada em todas as bases, seja da FNP, seja da FUP.

Não por acaso, as bases da FUP em que houve maior radicalização era onde estavam os bravos e combatentes companheiros das oposições da FNP. No Norte Fluminense, em Duque de Caxias e em São Paulo as bandeiras da FNP tremularam em muitos atos e as oposições foram, em muitas ocasiões, responsáveis por manter – ao lado da base – a força da greve e por dividir com as direções sindicais o papel de organizar os piquetes.

O que deixamos de conquistar?
Com a continuidade da greve poderíamos conquistar muitos avanços. Prova disso é que a greve foi capaz de um feito histórico: forçou a empresa a apresentar em três dias, três novas propostas de Acordo Coletivo.

Poderíamos, por exemplo, ter conquistado o abono integral dos dias em greve (inclusive para os terceirizados) e derrotar o principal ataque econômico da companhia: a imposição há 17 anos de aumento real zero no salário base – medida que afeta todos os trabalhadores, mas principalmente os aposentados e pensionistas. Este setor foi mais uma vez, com a ajuda e omissão dos governistas, excluído dos reajustes e benefícios concedidos aos ativos por meio de uma fraude salarial: as remunerações variáveis.

Por isso, ao contrário da FUP, não reproduzimos a lógica da empresa que tenta nos convencer de que os 8,56% na RMNR representam um enorme ganho. Pelo contrário, denunciamos essa política por representar um enorme ataque; mais uma vez, é através dela e da tabela congelada, que também poderia ser derrotada, que os aposentados só vão receber o IPCA (6,09%). Esse é um dos motivos principais pelo qual rejeitamos a proposta. A FNP nunca indicou e nunca indicará a aceitação de propostas que discriminem qualquer setor da categoria.

Nas questões sociais que valerão por dois anos, também não avançamos em bandeiras fundamentais como a periculosidade para valer, a AMS para os pais e 100% custeada pela empresa, a extensão do PAC do Junior para os plenos e seniors, progressão do ATS, Anistia, revisão do PCAC, capítulo de Petros e SMS de nossa pauta. Enfim, tudo isso ficou de fora.

Com isso, resta uma última reflexão: por que interessaria aos governistas quebrar a unidade? Por que tanta pressa para suspender a greve com tantas reivindicações para serem conquistadas? Cabe aos dirigentes da outra federação fazer uma profunda reflexão sobre os caminhos que irão tomar daqui pra frente. Porque, hoje, a resposta para a pergunta acima está em seu governismo, em seu compromisso com a empresa e o governo, que os impedem de ir até as últimas consequências pelos interesses dos trabalhadores. A independência em relação aos patrões e aos governos é uma necessidade dos trabalhadores. E este é um critério de classe que pavimenta o caminho trilhado pela FNP até aqui.

Os petroleiros saem desta greve de cabeça erguida e com uma disposição de luta muito grande para os próximos enfrentamentos, que certamente não serão fáceis. A política do PROCOP, de desinvestimentos e a continuidade dos leilões do petróleo continuam na pauta do governo. Mas depois da mobilização protagonizada pelos trabalhadores petroleiros está claro que para vencer é preciso lutar. Quem luta, conquista!

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