Venda de ativos da Petrobrás pode acarretar em prejuízos econômicos a Alagoas

O anúncio da venda dos campos da Petrobras em Alagoas, feito no último dia 17 de junho, deixou os petroleiros alagoanos em estado de alerta sobre seus futuros e também sobre o futuro do estado. Para além das preocupações pessoais, eles afirmam que a vinda de uma nova empresa no lugar da Petrobras pode resultar no aumento do preço de combustíveis, de botijões de gás, na precarização de postos de trabalho e em outros prejuízos para a economia alagoana.

Diante do anúncio da venda dos sete campos da Petrobras em Alagoas (campos Anambé, Arapaçu, Cidade de São Miguel dos Campos, Furado, Pilar, São Miguel dos Campos e Parú – esse último se trata de um campo de águas rasas), a Petrobras ofereceu aos servidores alagoanos a possibilidade de eles serem transferidos para outros estados ou aderirem ao programa de desligamento voluntário. Porém, muitos se encontram desnorteados entre deixar a vida construída em Alagoas ou abrir mão de um sonho, que seria continuar fazendo parte da empresa.

Um dos servidores que se encontra nessa posição se trata de Eduardo dos Santos Silva, técnico de operações pleno da petrolífera há 14 anos. Eduardo começou antes na estatal como funcionário terceirizado e após prestar concurso, se tornou servidor público da petrolífera. Como servidor público, ele passou a contar com benefícios da empresa que o ajudaram a dar uma vida melhor a sua família.

“Por causa da minha aprovação no concurso pude fazer um plano de saúde para os meus pais. Antes, nós não tínhamos condições. Após me casar, também pude contribuir com uma vida melhor para a família que construí”, contou.

Eduardo é casado, tem três filhas e paralelamente aos serviços da Petrobras, cursa Medicina em Maceió. Por causa das escalas noturnas e tempo de descanso, após cumprir plantões na estatal, ele viu a possibilidade de ampliar seus horizontes por meio de uma nova formação.

“A minha esposa trabalha aqui em Maceió, minhas filhas estudam aqui. A minha filha mais velha também faz faculdade. Caso eu escolha a transferência, eu teria que ir primeiro sozinho, com um custo que não tinha previsto, sem saber se a Petrobras irá me transferir de novo. E caso eu escolha pelo desligamento, não sei se conseguiria terminar a minha faculdade, como ficaria a escola das minhas filhas, a nossa qualidade de vida. É uma situação que está me desgastando”, detalhou.

Temor da Petrobras ser reduzida a “um escritório no Rio de Janeiro”

A alternativa em mudar de estado pode ser atrativa para quem já desejava essa mudança, mas, as condições apresentadas pela estatal podem não deixar essa opção tão estimável.

De acordo com o advogado e diretor do Sindicato dos Petroleiros de Alagoas e Sergipe (Sindipetro AL/SE, filiado à Federação Nacional dos Petroleiros), Luciano Alves, a Petrobrás estaria oferecendo aos petroleiros transferências a refinarias que estão à venda e que estão com processos mais avançados do que em Alagoas, como a Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia. A informação foi repassada durante transmissão ao vivo no Youtube, no canal do Centro Acadêmico do curso de Engenharia do Petróleo, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), na quinta-feira, 16.

Luciano ainda expôs que a intenção da estatal, atualmente, é priorizar os ativos de águas profundas, o pré-sal, mas ele teme que a empresa, posteriormente, seja reduzida a “um escritório no Rio de Janeiro”, para atender apenas a burocracias, já que o atual presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, defendeu a privatização de 99% das estatais em um evento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no ano passado.

“Uma empresa privada, estrangeira, não vai ter o mesmo compromisso que tem uma empresa que é nossa. Além do petróleo e do gás, a Petrobras também contribui com ciência, educação e arte no país. Cerca de 1% do orçamento da Ufal vem da Petrobras. 1% pode parecer que não é muito, mas ele contribui para a manutenção de laboratório, pesquisa, conta de energia. Em Recife, na UPE, a Petrobras investe num prédio de 10 andares”, afirmou.

Luciano também apontou sobre o risco da precarização dos empregos ofertados pela empresa que deve ficar no lugar da Petrobras em Alagoas, já que os salários e benefícios devem ser menores do que os ofertados pela estatal e também sobre o perigo do ponto de vista ambiental, já que a Petrobras segue diretrizes para diminuir o impacto da exploração de gás e petróleo e para atuar em segurança.

“No teaser que a Petrobras lançou, há a oferta dos campos em Alagoas a empresas de categoria B. Em analogia ao futebol, a Petrobras é como se estivesse na série A e eles querem vender um ativo para uma empresa da série B. Uma empresa da série B não vai seguir as mesmas diretrizes seguidas pela Petrobras”, afirmou.

Potencial produtivo em Alagoas

Ainda de acordo com Luciano, cerca de 20% da arrecadação de impostos em Alagoas corresponde aos impostos pagos pela produção da Petrobras. O gás produzido em Alagoas abastece o mercado alagoano com GLP (gás de cozinha), GNV (gás veicular) e gás industrial. O excedente dessa produção é enviado para os estados vizinhos, como Sergipe e Pernambuco.

A produção de petróleo em Alagoas corresponde a menos de 1% da produção nacional e a de gás corresponde em torno de 2%, informou a técnica de operação da Petrobras e membro da Diretoria de Base do Sindipetro AL/SE, Rosselliny Vieira.

Atualmente, o campo de Paru, localizado no Baixo Coruripe, onde o gás é extraído, incrementa na produção com mais de 200 mil metros cúbicos de gás diariamente. Após processado, em Pilar, esse gás equivale a 6 mil botijões de gás de cozinha, além de gás industrial e GNV, que é distribuído por meio das instalações da Algás, empresa cuja qual a Petrobras também tem participação.

“Em 2006, quando ingressei na empresa, éramos cerca de 400 funcionários próprios e a produção em Pilar chegou a 1000m3 por dia. Foi mais ou menos nessa época que o Brasil atingiu a autossuficiência em petróleo. Hoje, com menos de 200 funcionários e menos recursos, não conseguimos chegar a 100m³ por dia”, informou Rosselliny.

A funcionária apontou que essa queda brusca na produção e no quadro de funcionários foi resultado de um plano de desinvestimento da Petrobras em campos terrestres e de águas rasas. No momento, a estatal direciona seus investimentos ao pré-sal.

“A escassez de recursos como sondas de produção e limpeza levaram a diminuição da produção dos campos maduros como é o caso de Alagoas. Além disso a suspensão dos concursos públicos e a transferência de funcionários para o sudeste, reduziu drasticamente a mão de obra direta”, contou a técnica de operação.

Quando perguntada se a produção em Alagoas ainda teria potencial, Rosselliny afirmou que sim, que os custos de produção e extração no estado sempre estiveram entre os menores do país e que isso representa rentabilidade. Mas que, para que o potencial produtivo de Alagoas seja expandido, investimentos teriam que ser feitos.

Venda que pode pesar no bolso do alagoano

Caso a venda dos ativos em Alagoas se confirme, há o risco de aumento nos preços de gás de cozinha, gás veicular e gás industrial no estado, além do aumento de outros produtos que dependem desses insumos, afirmou Rosselliny. Ela explica que isso pode acontecer também devido à falta de concorrência no mercado.

“É uma questão que vai além do mercado, o serviço de abastecimento de combustíveis é considerado, pela constituição brasileira, como de utilidade pública e só uma empresa estatal tem visão social e finalidade de atender ao interesse público. Na prática podemos citar o exemplo da concessionária de energia elétrica em Alagoas que foi privatizada e os preços repassados aos consumidores subiram expressivamente”, contou.

A funcionária ainda conta que a venda também ameaça a perda de empregos indiretos, além dos empregos direitos, e que a empresa compradora dos ativos pode importar a sua própria mão de obra.

Outro ponto preocupante apontado com Rosselliny se trata dos projetos de lei previstos para que os royalties para campos maduros (campos que há muito tempo são explorados para a extração de petróleo ou gás, como os de Alagoas) sejam diminuídos. Nesse caso, o benefício pago que beneficiaria estados e municípios seria menor. Em contrapartida, a empresa se comprometeria em arcar com investimentos para o aumento da exploração do campo.

De acordo com reportagem da Gazeta de Alagoas, de janeiro a maio deste ano foram distribuídos R$49,31 milhões em royalties entre os municípios alagoanos produtores de petróleo e gás natural. No mesmo período, no ano passado, foram registrados R$ 43,18 milhões em distribuição. A informação foi colhida com a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

O anúncio do ativo de Alagoas, em meio a pandemia do novo coronavírus, também indicaria um risco de perda financeira.

“Com a pandemia de covid-19 houve queda no consumo de combustíveis e uma venda nesse momento, de desvalorização do petróleo, levaria a um prejuízo enorme aos cofres públicos”, frisou técnica de operações.

Servidores buscam impedir a venda dos ativos em Alagoas

Somente neste ano, houve o fechamento da sede administrativa da Petrobras em Sergipe, do Polo Tecarmo, no bairro Atalaia e da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen). E de junho até o momento, a estatual anunciou a venda de cinco unidades, o Pólo Ceará, Pólo Urucu, Campo de Tartaruga, Petrobras Biocombustível e o ativo em Alagoas.

Os servidores em Alagoas juntamente ao Sindipetro AL/SE buscam meios para que a sociedade tome conhecimento dos riscos que a venda dos ativos da Petrobras oferece ao país, para que assim uma pressão seja criada para que a estatal seja preservada.

Na última quarta-feira, 15, representantes do Sindipetro AL/SE se reuniram com deputados federais para que eles se sensibilizassem com a luta dos petroleiros. A expectativa é de que mais parlamentares se juntem a causa para que, no Congresso Nacional, as vendas possam ser barradas. Porém, independe das conversações com políticos, a classe de petroleiros apela a população para que as vendas sejam barradas por meio do clamor popular.

Fonte: O Dia Mais

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